Filmes: O Palhaço (2011)

Gênero: Drama/Comédia
Duração: 88min
Origem: Brasil
Direção: Selton Mello
Roteiro: Selton Mello, Marcelo Vindicatto
Produção: Selton Mello, Vânia Catani
Todo ano surge no cinema pelo menos um filme que a princípio, só parece mais um no cinema, mas que tem uma sinceridade incomparável e uma sensibilidade que está se perdendo cada vez mais, usando com maestria toda a magia que uma sala de cinema pode proporcionar. Normalmente, quem faz isso de um modo único é a Pixar, mas esse ano o estúdio ficou só no caça-níquel então esse posto ficou vago. Até agora.
Depois de estrear na direção com um ótimo, mas melancólico filme (Feliz Natal), Selton Mello traz esse trabalho incrível e muito superior ao anterior, daqueles que conseguem fazer o espectador esquecer que está numa sala de cinema, chegando até a ser triste quando o filme acaba, tamanha a felicidade que ele proporciona. E confesso que eu não fui preparado pra isso quando fui assistir O Palhaço
O roteiro, escrito por Mello e Marcelo Vindicato, traz uma trupe circense comandada por Valdemar (Paulo José) e Benjamin (Selton Mello), pai e filho que no picadeiro encarnam os palhaços Puro Sangue e Pangaré. Benjamin, no entanto, parece meio perdido no que está fazendo, sem a maquiagem e o nariz vermelho, é uma pessoa quieta, triste e vaga, tudo porque não sabe muito bem se está no lugar certo.
A ideia do palhaço triste já foi largamente usada, não só no cinema mas numa série de outras coisas (nunca esqueço a piada do palhaço Pagliacci deWatchmen) e o filme poderia cair no clichê, não fosse o extremo carinho que Mello parece ter pela história, conduzindo o filme de modo cuidadoso e construindo personagens absolutamente adoráveis, que fazem toda a diferença.
Chega a ser espantoso ver como o ator e agora diretor amadureceu por trás das câmeras. Sua direção é segura e um tanto cuidadosa, como podemos ver logo na sequência inicial no circo (que já consegue o feito de ressaltar tudo de melhor do filme), com vários planos que nos fazem esquecer por alguns momentos que estamos vendo um filme, parecendo que estamos assistindo mesmo o simples mas belo espetáculo da trupe. Além disso, o cineasta faz questão de mostrar cada membro da trupe nas suas posições, ressaltando a alegria que eles sentem de estar ali, mesmo nas funções mais simples, além dos constantes closes nos rostos felizes do público. Só essa primeira cena é de tanta beleza que imediatamente nos ligamos ao filme, pra não desligarmos mais.
Apesar de Selton Mello brilhar no papel principal, é ótimo ver que ele passa longe de roubar o filme pra si com a sua arrebatadora atuação. Todo o elenco faz um belo trabalho, destaque é claro, pra Paulo José, que faz rir e chorar (mesmo!) fazendo dupla com o protagonista e diga-se de passagem, como é bom ver esse grande ator num papel de destaque. E a garotinha, Larissa Manoela, uma revelação (sua cena no final do filme é uma das mais lindas que vi no cinema esse ano). Os personagens são tipos simples (o cara mais atrapalhado, o mulherengo, a mãezona…) mas que conseguem encantar e conquistar facilmente o espectador, tanto pela simplicidade já citada quanto pela delicadeza e sinceridade das interpretações. E o que dizer das participações especiais de nomes tão queridos pelos brasileiros, como Ferrugem (“Brincadeirinha moço…”) e Moacyr Franco, este último rendendo um dos melhores e mais engraçados momentos do filme.
Em aspectos técnicos, O Palhaço é primoroso. A fotografia é incrível, especialmente no segundo ato, que é quando o filme ganha um clima de road movie e não perdem a chance de beneficiar cada lugar por onde Benjamin passa. E a direção de arte é impressionante, conseguindo nos mergulhar na época do filme sem que isso precise ser esfregado na nossa cara. O roteiro consegue equilibrar perfeitamente o drama e a comédia, o caminho percorrido por Benjamin, com suas dúvidas e incertezas sobre o que faz e o que deve fazer, em momento algum soa forçado (alias, poucas vezes me identifiquei tanto com um filme em toda minha vida por isso) e a metáfora da história toda (o ventilador) é inteligente e muito bem amarrada, tendo uma bela solução, mas o que vale no filme mesmo é o respeito e o carinho pela cultura circense e toda a sua magia que, com tão pouco consegue encantar tanto.
Num ano que nos apresentou blockbusters que na sua maioria (salvo pouquíssimas exceções) eram mega-produções inchadas mas vazias ou filmes que por melhores que fossem soavam um pouco pretensiosos demais,O Palhaço veio munido apenas de uma boa história e bons atores, porque são esses elementos, mais do que qualquer outro, que vão ter que nos conquistar,  afinal, assim como o circo não funciona sem o palhaço e a música, um filme não vale nada sem uma boa história a se contar e bons atores para nos fazer acreditar nela. E tal como um circo mambembe, é com pouco que o filme de Selton Mello consegue fazer rir, chorar e proporcionar toda a maravilha que é ir ao cinema.
Afinal de contas, o gato bebe leite, o rato come queijo… e eu tenho orgulho em dizer que o melhor filme de 2011 até agora, é brasileiro.

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